Dezembro - 2023 - Edição 298

O Navio Negreiro

Originalmente inserido na obra Os Escravos, publicada anos depois da morte de Castro Alves, O Navio Negreiro é um clássico que sobrevive ao tempo e que nos leva a refletir sobre a formação desta grande – e desigual nação – que é o Brasil. A obra do abolicionista retrata a crueldade a que eram submetidos os escravos na travessia atlântica. Estamos em pleno século 21 e, mesmo com todo o progresso e os avanços sociais, os reflexos de anos de segregação racial e trabalho escravo se fazem notar. Estamos em pleno sistema democrático e o racismo persiste como realidade. Os anos não conseguiram extirpar as raízes de séculos de exploração. As desigualdades são diárias, as humilhações são chagas recorrentes. Passado mais de 100 anos da lei assinada pela Princesa Isabel pondo fim à escravidão no Brasil, e a cor da pele ainda é fator relevante em questões como educação, trabalho, habitação e concentração de riquezas. O Navio Negreiro, obra prima de Castro Alves, com apresentação de Nei Lopes e ricamente ilustrado por André Côrtes, sai pela égide do Grupo Editorial Zit (selo Escrita Fina).

Memórias de um estilista

Inventivo, autêntico, poético: estas são algumas das muitas características de Ronaldo Fraga. Mas o estilista é muito mais. Artista multifacetado que saiu de Minas Gerais para o mundo, fincando sua estrela entre os principais nomes da moda internacional, ele relembra, neste livro de entrevistas conduzidas pela jornalista Sabrina Abreu, os momentos mais marcantes de sua trajetória pessoal e profissional. Memórias de um Estilista Coração de Galinha (Autêntica Editora) é fruto de nove anos de encontros entre entrevistadora e entrevistado, com conversas que passam pelos mais diversos temas. Das passarelas à vida privada, estão presentes neste livro as memórias de infância, os tempos de faculdade, o período que viveu em Nova Iorque e em Londres, a militância política, os relacionamentos, as principais coleções, a conturbada ligação de amor, ódio, sonho e crítica com a moda. Em formato de entrevista, ilustrado com fotos e croquis, Memórias de um Estilista Coração de Galinha desnuda o processo criativo do designer, suas referências e andanças do Norte ao Sul do Brasil, com humor afiado e sem fugir das polêmicas. Enquanto os diálogos avançam, acompanhamos o aprofundamento da relação entre entrevistado e entrevistadora e, por que não dizer, também do leitor, que tem nesta obra uma oportunidade única de compartilhar da intimidade destes encontros.

Disque Denúncia

Nos anos 1990, uma onda de sequestros aterrorizou a população do Rio de Janeiro. Em meio à escalada na violência, começa a ser desenhado o projeto de uma central telefônica para receber ligações anônimas relatando crimes. Experiente na cobertura da segurança pública no estado do Rio, Mauro Ventura acompanhou de perto o nascimento do Disque Denúncia, que, desde sua criação, em 1995, recebeu quase 3 milhões de denúncias, que resultaram na prisão de mais de 20 mil bandidos e na apreensão de cerca de 42 mil armas e munições, além de 33 toneladas de entorpecentes. Após três anos de pesquisa, Mauro Ventura reuniu os casos mais dramáticos dos 28 anos de atuação do serviço. Com pleno acesso ao banco de dados, Ventura não apenas reconstitui os crimes como também a experiência de quem os vivenciou de perto. Os casos selecionados formam um panorama do crime no Brasil: a maior apreensão de cocaína da história do Rio, a morte chocante de uma criança de 6 anos, a chacina de inocentes por policiais corruptos, sequestros midiáticos, tentativas de fuga de prisão cinematográficas. Crimes solucionados graças ao Disque Denúncia, que, ao longo de quase três décadas, jamais comprometeu o anonimato de um denunciante. Com uma apuração rigorosa, incorporando relatos de dezenas de protagonistas e participantes, Mauro Ventura constrói um relato revelador da política de segurança pública mais eficiente e longeva do Rio de Janeiro.

Grafias de Vida e Morte

Referência incontornável no campo dos estudos literários, Silviano Santiago possui produção extensa, entre romances, contos e ensaios. Grafias de vida – A Morte dá nova prova da criatividade e perspicácia discursiva de Santiago, em um estilo que lhe é próprio. Nos ensaios aqui reunidos, encontramos, entre outros temas, a crítica ao cânone único e ocidentalizante, a defesa de uma escrita selvagem e libertária, a problematização da domesticação, conceito caro ao autor, além de reflexões sobre o espaço e tempo do fazer artístico. Nas palavras do escritor, “são grafias desequilibradas de vida, que propõem a busca de equilíbrio entre o sentimento de mundo e o sentimento da vida, entre a mesa posta e a cadeira onde se toma assento, entre o corpo na casa e o pé no mundo, entre o alimento e a fome, entre o tronco de buriti do sertão e a ridícula cadeirinha ouro-pretana”. Doutor em letras pela Sorbonne, Silviano começou a carreira lecionando nas melhores universidades norte-americanas. Transferiu-se posteriormente para a PUCRio e é, hoje, professor emérito da UFF. Foi cinco vezes premiado com o Jabuti. Pelo conjunto da produção literária, ganhou o prêmio Machado de Assis da Academia Brasileira de Letras e o José Donoso, do Chile. Recebeu do governo francês a distinção de Officier dans l’Ordre des Arts et Lettres e Chevalier dans l’Ordre des Palmes Académiques. Ganhou o prêmio Camões de 2022.

O Potencial da Mudança

Neste livro inspirador, Rodrigo compartilha suas histórias e oferece as ferramentas e estratégias necessárias para transformarmos as adversidades em trampolins para o sucesso pessoal e profissional. Uma das grandes miragens da humanidade é a ilusão de controle. Boa parte de nossa rotina é composta por ações que foram planejadas e outras que se tornaram hábitos, mas não podemos acreditar que essa situação seja inabalável. Acontecimentos inesperados estão aí para nos provar isso. E, ainda que alimentemos a crença de que as imposições da vida necessariamente nos empurram para o fracasso, nem sempre é assim. Às vezes, são as fases em que vivemos maior estabilidade que nos levam ao autoengano, à crença de que é só seguir o fluxo para continuarmos tendo sucesso e satisfação. A experiência de ter fundado ainda muito jovem uma escola de arte inclusiva despertou em Rodrigo um interesse, até então desconhecido, pelo universo da gestão e da liderança. Neste livro, o leitor acompanhará todos esses passos, e como Rodrigo desenvolveu um modelo que pode ser aplicado a várias situações da vida. Ele pode ser resumido em três grandes conselhos: mantenha a resiliência nos propósitos, conquiste autonomia de pensamento e adquira plasticidade na ação. Afinal, não é o mais forte nem o mais inteligente que sobrevive, mas quem melhor navega pelas continuidades e upturas inerentes à vida.

A Face Oculta de Eva

Apesar de ser um dos países com o maior número de feminicídio do mundo, a vivência da mulher brasileira para a da mulher árabe é muito diferente. O que une as experiências é o fato de que todas estão sob o controle do patriarcado, ainda que elas sejam afetadas pelo mesmo de forma bem diferente. Em A Face Oculta de Eva, a autora Nawal el Saadawi começa a desmistificar os estereótipos ocidentais que tentam definir as mulheres árabes e suas lutas, mostrando como essas mulheres são afetadas pelo sistema e como elas moldam suas lutas. Ela faz isso ao apontar a sua caneta para as mulheres árabes comuns e suas rotinas, abordando a luta diária de mulheres que arcam com as consequências do patriarcado na pele. Os últimos acontecimentos no mundo árabe mostram exatamente como sua narrativa se torna essencial ainda hoje: a emancipação dessas mulheres é pauta extensa em todas as discussões feministas. Com base religiosa, política e outras fontes, a autora mistura estudo com relatos pessoais – que dão rosto e voz para mulheres árabes que pensam, lutam e falam o que pensam, sempre. Nawal El Saadawi foi ativista e escritora, reconhecida internacionalmente por sua luta pelos direitos das mulheres no Egito e no exterior. Sua vida foi marcada por perseguições políticas, já que seu posicionamento era afiado e suas críticas sempre contundentes à sociedade árabe. Teve uma produção prolífica, entre ficção e não ficção, publicando mais de 40 obras. Morreu no Cairo, em 2021, aos 89 anos.