Junho, 2023 - Edição 292

Heloísa Buarque de Hollanda imortal

Pela primeira vez na história da Academia Brasileira de Letras, o processo de votação foi feito com uma urna eletrônica do TRE. Isso aconteceu na eleição de Heloísa Buarque de Hollanda, professora emérita da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que irá ocupar a cadeira 30, na vaga que ficou aberta em dezembro do ano passado com a morte da saudosa acadêmica Nélida Piñon, primeira mulher a presidir a ABL.

Em entrevista, a nova imortal declarou: “A eleição para a ABL representa o último trabalho numa instituição poderosa, de muito respeito e prestígio. Minha vida sempre foi institucional, da UFRJ. Sou apaixonada por grandes instituições. E essa é de muito peso. A Academia está nesse movimento de abertura, e essa é uma das razões pelas quais me candidatei. Vou trabalhar muito, é um compromisso: fazer tudo que puder.”

A escritora e crítica cultural, de 83 anos, é considerada uma das principais vozes do feminismo brasileiro e a maior intelectual pública do país. Tem formação em Letras Clássicas pela Puc-Rio, mestrado e doutorado em Literatura Brasileira na UFRJ e pós-doutorado em Sociologia da Cultura na Universidade de Columbia, em Nova York.

Além disso, é diretora do Programa Avançado de Cultura Contemporânea da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a UFRJ, onde coordena o Laboratório de Tecnologias Sociais, do projeto Universidade das Quebradas, e o Fórum M, espaço aberto para o debate sobre a questão da mulher na universidade. Seu campo de pesquisa privilegia a relação entre cultura e desenvolvimento, área em que se tornou referência, dedicando-se às áreas de poesia, relações de gênero e étnicas, culturas marginalizadas e cultural digital. Nos últimos anos, vem trabalhando com o foco na cultura produzida nas periferias das grandes cidades, o feminismo, bem como no impacto das novas tecnologias digitais e da internet na produção e no consumo culturais.


Heloísa é também diretora da Aeroplano Editora e Consultoria, da Editora UFRJ e do Museu da Imagem e do Som (MIS-RJ). Dirigiu o Programa Culturama, na TVE, Café com letra, na Rádio MEC e alguns documentários cinematográficos, entre eles, Dr. Alceu e Joaquim Cardozo. Foi curadora de várias exposições, entre elas Dez anos sem Chico Mendes (Sesc Rio, 1998), Estética da Periferia (Centro Cultural dos Correios, RJ, jul/2005), H20, o futuro das águas (Sesc Rio, jan/2009), Vento Forte: 50 Anos de Teatro Oficina (Centro Cultural dos Correios RJ, jan/2009) e O Jardim da oposição (Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio, jun/2009).

A nova acadêmica tem vários artigos publicados nas áreas de arte, literatura, feminismo, cultura digital, cultura da periferia e políticas culturais. Entre os livros, destaca-se a histórica coletânea 26 Poetas Hoje, de 1976, revelando uma geração de poetas “marginais” que entrou para a história da literatura brasileira, como Ana Cristina Cesar, Cacaso e Chacal. Essa antologia é considerada um divisor de águas entre poesia canônica e poesia contemporânea e performática. Segundo a autora, o livro causou furor na época.


Outros livros publicados por Heloísa são Macunaíma, da Literatura ao Cinema; Cultura e Participação nos Anos 60; Pós-Modernismo e Política; O Feminismo como Crítica da Cultura; Guia Poético do Rio de Janeiro; Asdrúbal Trouxe o Trombone: Memórias de uma Trupe Solitária de Comediantes que Abalou os anos 70; Escolhas, uma Autobiografia Intelectual; e Feminista, Eu?. Nascida em Ribeirão Preto (SP), em 1939, a nova imortal passa a ser a 9ª mulher eleita para a ABL, com 34 votos, de 37. Superou os escritores Oscar Araripe, Denilson Marques da Silva, José Gildo Pereira Borges e José Milton Monteiro Araújo da Silva. A Cadeira 30 tem como fundador o contista Pedro Rabelo, como patrono o jornalista e romancista Pardal Mallet, e teve como titulares o advogado Heráclito Graça, o médico Antônio Austregésilo e o ensaísta, filólogo e lexicógrafo Aurélio Buarque, além de Nélida Piñon.

O presidente da ABL, Merval Pereira, destacou a atuação da nova acadêmica: “Ela é uma feminista pioneira. Isso tem muita importância para nós, temos várias representantes desse movimento. Heloísa é uma intelectual que há muito tempo estuda questões específicas da literatura brasileira, de jovens e de periferias. Ela se destacou como professora e estudiosa no trabalho de divulgação e análise dessas literaturas de cadernos de mimeógrafos, panfletos, distribuídos nas ruas. Descobriu neste veio importância cultural, lançou vários poetas importantes. Marcou presença na cultura brasileira e, por isso, está aqui”, afirmou Merval.

Por Manoela Ferrari