Novembro, 2023 - Edição 297

O super vice-presidente da República

O médico Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho nasceu em Pindamonhangaba em 7 de novembro de 1952. Quando jovem, teve discreta participação no movimento estudantil. Recebeu de um amigo o convite para se candidatar a vereador. Foi eleito com cerca de 5. 000 votos – um recorde para a cidade do interior de São Paulo da época.

Geraldinho, como o governador ainda é conhecido em Pindamonhangaba, a 145 km de São Paulo, no Vale do Paraíba, cursava medicina na vizinha Taubaté e, segundo seus colegas da época, não pensava em se candidatar sequer ao grêmio estudantil da faculdade. Por conta disso, foi com surpresa que a família ouviu do rapaz magro a notícia de que havia aceitado o convite do então presidente do MDB de Pindamonhangaba, Paulo Delgado, para tentar uma vaga na Câmara Municipal. Delgado arregimentava jovens para a disputa das eleições nas fileiras do Movimento Democrático Brasileiro, o MDB, que fazia oposição à Arena (Aliança Renovadora Nacional) e ao regime militar (1964-1985).

O objetivo de Delgado e seu grupo era renovar a cena política de Pindamonhangaba e deixar para trás nas urnas velhos caciques arenistas. Por conta do bipartidarismo imposto pela lei, os jovens da cidade se abrigaram sob a mesma legenda que deu guarida nos anos 70 a radicais de esquerda e a adeptos da luta armada. O jovem vereador Alckmin havia sido sondado pelo partido para ser candidato a prefeito. A consulta ao “doutor” Geraldo, antes de decidir aceitar o convite para disputar a prefeitura, não era mais uma firula de um candidato titubeante. Alckmin perdera a mãe cedo. Miriam Penteado Alckmin tinha 49 anos quando morreu de complicações cardíacas agravadas por uma bronquite asmática.

Aos 10 anos, o caçula Alckmin só foi informado no final da tarde daquele 12 de junho que a mãe amanhecera morta. Apesar da forte ascendência sobre o filho, o velho Geraldo, agrônomo do Estado, enxadrista exímio, costumava não interferir nas decisões do filho. Alckmin aceitou o convite e, aos 23 anos, em 1976, foi eleito prefeito. O pai o acompanhou na prefeitura, onde foi chefe de gabinete de Alckmin. O procurador de Justiça Thiers Fernandes Lobo, que seria o candidato a prefeito, acabou saindo como vice.

Hábitos comedidos

Alckmin é comedido na alimentação. Jovem, não bebia nem fumava. Sugeria aos amigos mamões depois almoço. “É digestivo”, dizia. Um dia na casa da avó, já prefeito, ele sumiu. Foi encontrado em uma árvore, de terno e gravata, comendo jabuticabas. Do pai, que era católico franciscano, herdou a religiosidade. Em um filme 16 mm, guardado por San Martin, é possível ver Alckmin aos seis anos fazendo a primeira comunhão. Com a morte da mãe, a família deixou o sítio onde vivia e foi morar com os avós maternos de Alckmin no centro de Pinda. É dessa época a professora mais brava que o menino teve: a freira alemã Sigsberta, que colocava as crianças de castigo no canto da sala e era o motivo de calafrios. No colégio, o governador não era o primeiro da turma, mas se destacava pela boa memória. Dizia-se santista, como o pai, mas não era muito fã das partidas de futebol. Jogava apenas quando elas eram no campinho do sítio. Mesmo prefeito, Alckmin concluiu a residência e tornou-se anestesista. Chegou a exercer a profissão na Santa Casa de Pinda, mas, em 1982, se elegeu deputado estadual pela primeira vez. Antes, em 1979, casara-se com Maria Lúcia, que ele conhecera em um baile em Pinda. Ele e “dona Lú”, como a primeira-dama ficou conhecida, têm três filhos – Sophia, Geraldo Neto, e Thomaz, que tem um filho. Na Assembleia, Alckmin expandiu sua base eleitoral, reelegeu-se e, em 1986, lançou-se candidato à Constituinte. Eleito para a Câmara dos Deputados, aproximou-se de Mário Covas (1930-2001), Franco Montoro (1916-1999) e Fernando Henrique Cardoso, o grupo de cardeais do então PMDB que, com o atual governador, fundaria em 1988 o PSDB. Em Brasília, não chamou a atenção do grupo pela habilidade política, mas pela dedicação e pelo espírito apaziguador. O trabalho no Congresso ajudou Alckmin a ganhar a indicação dos tucanos para ser vice de Covas em 1994 e 1998.

Derrotas e vitórias

Em 2000, candidatou-se à Prefeitura de São Paulo, mas perdeu a vaga no segundo turno para Marta Suplicy (PT) por 7.691 votos. Covas, satisfeito com o desempenho de seu vice, comentava: “Não disse que ele era bom?” No Palácio dos Bandeirantes, coordenou o processo de desestatização e assumiu o comando em março de 2001, com a morte de Covas. Em janeiro de 2002, a crise da segurança colocou em xeque sua capacidade de liderança. Naquele mesmo ano, Alckmin começou a campanha em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto para o governo de São Paulo, atrás de Paulo Maluf (PPB). Acabou eleito no segundo turno, vencendo o então candidato do PT, José Genoino, com 58, 64% dos votos. Pelo seu estilo discreto, o governador é conhecido também como “picolé de chuchu”, apelido dado pelo colunista do UOL e da Folha de São Paulo José Simão. Para chegar ao cargo de governador do Estado de São Paulo, o médico pindamonhangabense Dr. Geraldo José Rodrigues Alckmin filho, certamente, teve muitas pessoas importantes em sua vida. Mas, com certeza, uma mulher simples, humilde, bondosa, sempre presente na vida da família Alckmin, foi uma dessas pessoas mais importantes. Thereza Faria Santos, popularmente conhecido por “Nhá”, foi responsável por cuidar do menino Geraldinho desde muito pequeno.

Após a vitória de Alckmin nas eleições de 2010, “Nhá” me concedeu esta entrevista exclusiva, para o Jornal da Cidade do qual eu era o editor-chefe:

Onde a senhora nasceu?
Nhá – Nasci em Natividade da Serra, em 12 de maio de 1940, signo de Touro, filha única de Sebastião Antonio dos Santos e Margarida Soares dos Santos, sou solteira até hoje.

E como e quando veio para Pindamonhangaba?
Nhá – Vim para a cidade em agosto de 1953, com 13 anos de idade, porque os pais do menino Geraldo – Dr. Geraldo José Rodrigues Alckmin e Dona Myriam Penteado Rodrigues Alckmin – precisavam de uma pajem para cuidar dele.

Onde a família residia quando a senhora aqui chegou?
Nhá – Eles moravam numa casa no centro da cidade, onde hoje é a loja da Casas Bahia. Depois de um ano nos mudamos para a residência no Haras Paulista, onde o Geraldinho comemorou seu primeiro aniversário.

A senhora criou Geraldo Alckmin desde que idade?
Nhá – Ajudei a criá-lo desde que ele tinha seis meses de idade até jovem, quando saiu da casa dos pais para se casar com Maria Lúcia Ribeiro Alckmin, a “Lu”, que a partir de 1º de janeiro de 2011 voltaria a ser a primeira-dama do Estado de São Paulo.

Como era a família Alckmin na época?
Nhá – Era formada pelos pais e pelas crianças, Geraldinho com seis meses, a Maria Aparecida “Mimi” com dois anos e a Maria Izabel com um ano de idade.

Como foi a convivência com a família durante tantos anos?
Nhá – Foi maravilhosa, uma ótima escola para mim que também era menina. O Dr. Geraldo (pai do Geraldinho) era ótimo chefe de família, muito inteligente e culto, e principalmente religioso católico. A hora de rezarmos o terço, de irmos às missas e às comemorações religiosas era sagrada. E a Dona Myriam também tinha uma ótima formação em todos os sentidos.

E o garoto Geraldinho, como era?
Nhá – Ele sempre foi um menino muito reinador, mas ótima pessoa. Na escola sempre foi bom aluno e tirava só notas boas. Ele gostava de criar frangos e galinhas e ovos, que vendia para a própria família para ganhar seu dinheirinho.

Geraldo já mostrava ter o dom de falar bem?
Nhá – Sim, sempre foi muito falador. Quando se formou no Externato São José, como orador da turma, já demonstrou o dom de discursar que hoje todo o Brasil conhece. E também a calma e paciência: durante o discurso o papel caiu no chão, tranquilamente ele se abaixou, pegou o papel e continuou o discurso.

Qual foi o momento mais triste para a senhora com a família Alckmin?
Nhá – Foi no dia 12 de junho de 1963, quando faleceu dona Myriam, mãe das crianças. O Geraldinho tinha 11 anos de idade e percebi que minha responsabilidade com ele e com a família passaria a ser muito maior a partir daquele instante. Foi uma tristeza difícil de ir embora, para todos nós.

A senhora achava que aquele pequeno garotinho iria tão longe na vida?
Nhá – Achava sim, pela inteligência que ele sempre demonstrou; pelos familiares que haviam se destacado na política como deputado e ministro, eu tinha certeza que o Geraldo também era um predestinado a ser um grande homem.

Mesmo após as derrotas para prefeito de São Paulo e presidente, a senhora achava que ele ainda seria um vitorioso?
Nhá – Sim, nunca deixei de acreditar nele, tinha certeza que voltaria a governar o Estado mais poderoso da Nação.

O apelido de Geraldo quando garoto era “Paiau”, qual o motivo?
Nhá – É porque como ele gostava de fazer gracinhas, Dona Myriam, sua mãe, o chamava de palhacinho. A Mimi queria chamá-lo assim também, mas não saía, só saía “paiau”, aí o apelido pegou.

Qual a sensação da senhora hoje, vendo a criança que a senhora criou praticamente a vida toda, como um dos políticos mais importantes e queridos do Brasil?
Nhá – Nossa, a alegria é muito grande, minha felicidade é enorme, oro todo dia a Deus para mantê-lo sempre esse homem educado, o político honesto e competente, esse modelo de grandioso ser humano e exemplo moral para a política do nosso país.

Por Nelson Valente – professor, jornalista e escritor