Dezembro, 2023 - Edição 298

Lá se foi um líder...

Afirmo, sempre, que “o gênio habita o mundo da simplicidade.”
E nessa vastidão que os gênios dormem para sonhar as suas quimeras, verdadeiras utopias para os mortais. Todavia, sonhos inimagináveis irrompem para eles, como fossem relâmpagos nos céus da memória, transcendentes da materialidade telúrica, com visões que ultrapassam o incognoscível da gnose humana. Os gênios são solitários em seus pensares!

O comum não lhes pertence, pois voam pelas asas da imaginação, singulares e siderais. Adriano Moreira sempre pautou o seu viver pelos meandros do universo da singeleza, do trato fraterno, da interatividade comportamental entre Brasil e Portugal, alçando voos geopolíticos a frente do tempo, a feitio de um Dom Quixote transoceânico.

Tornei-me seu discípulo e admirador intransigente. Um fiel escudeiro e ouvinte atento, a tecer loas espiritualmente, a fim protegê-lo de maldições e malquerenças! A Capital da Esperança e a Academia de Letras de Brasília sempre o receberam com pompa e circunstância, quando mereceu o galardão de Membro Honorário, honrando-nos com a abertura do Congresso Internacional da Língua Portuguesa, a reunir as nove nações componentes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – CPLP. Um evento de magnitude incomum no mundo lusófono, na linha do Equador!

Graças à sua antevisão sociológica e pragmatismo, ensejou o estabelecimento de laços acadêmicos entre a entidade da Capital do Brasil e a Academia das Ciências de Lisboa, a fortalecer vínculos e raízes profundas, harmônicas e viscerais.

Adriano Moreira me faz lembrar Francis Bacon (1561-1626). Dizia o ex-Lord Chanceler do Reino Unido, Pai do Método Experimental:
“A leitura faz culto o homem. A conversa o faz ágil e o escrever o faz preciso.”

Um ser longevo e lúcido, que completou, no dia 6 de setembro de 2022, o seu centenário vivencial, meio à uma falange de amigos, admiradores, familiares, envolto pela sua Primeira Dama – Isabel Mónica de Lima Mayer e, dentre eles, a figura incansável do Almirante António Carlos Rebelo Duarte, presidente da Academia Internacional da Cultura Portuguesa – AICP. O Restelo esteve em festa, às margens do Tejo!

Entretanto, a humanidade é regida por ciclos e ritos, a encerrar inícios, meios e fins, razão pela qual a alma gigantesca de Adriano José Alves Moreira, transmontano de Grijó, transferiu-se pelo Rito de Passagem, aos páramos da Eternidade, no dia 23 de outubro de 2022.

O Restelo chorou, então, às margens do Tejo! As tágides, ninfas do latino Tagus, a feitio de nereidas greco-latinas, vieram receber Adriano Moreira acompanhadas de Luís de Camões, rumo ao Olimpo, assim:

“E vós, Tágides minhas, pois criado Tendes em mim um novo engenho ardente, Se sempre em verso humilde celebrado Foi de mim vosso rio alegremente, Dai-me agora um som alto e sublimado, Um estilo grandíloquo e corrente, Porque de vossas águas, Febo ordene Que não tenham inveja às de Hipocrene. Dai-me uma fúria grande e sonorosa, E não de agreste avena ou frauta ruda, Mas de tuba canora e belicosa, Que o peito acende e a cor ao gesto muda; Dai-me igual canto aos feitos da famosa Gente vossa, que a Marte tanto ajuda; Que se espalhe e se cante no universo, Se tão sublime preço cabe em verso.”

Por José Carlos Gentili