Maio, 2023 - Edição 291

Abril, mês dos livros

T. S. Elliot (1888-1965), poeta inglês de origem norte-americana, publicou, em 1922, A Terra Devastada, sua obra-prima. Pelo conjunto da obra, ganhou o Prêmio Nobel de Literatura, em 1948. Nesse livro, ele afirma: “Abril é o mais cruel dos meses, germina lilases da terra morta, mistura memória e desejo, aviva, agônicas raízes com a chuva da primavera.” No hemisfério norte, abril equivale a outubro, para nós. E o tempo refletido no poema é o pós-primeira guerra, com a Europa devastada, “terra morta”, brotos ressurgindo com a chuva da primavera. “O mais cruel dos meses” refere-se à memória, o passado ruim, e o desejo de vida que renasce. Para nós, abril é mês de outono, que se iniciou em março, tempo de frutas, de colheitas (do café, do milho, do feijão), após o calor intenso do verão. Portanto, nada do “horrível” ellioteano.

Sempre gostei do outono em nosso hemisfério, desse período que vai de março a junho, após o calor infernal do verão, ou das chuvas torrenciais que costumam provocar desastre e inundação. Em abril, após as “chuvas de março fechando o verão”, a natureza nos brinda com os frutos, os pássaros entram no período da muda, silenciam-se e se alimentam com as sementes dos campos e os frutos do outono, que os fortalecerão para uma nova temporada de reprodução, quando vier a primavera. E ela virá, certamente, enquanto o planeta não for totalmente destruído pela insanidade humana.

Abril é especial para nós, escritores e leitores, pois carrega quatro datas significativas ao universo dos livros e dos leitores. Dia dois, comemorou-se o dia internacional do livro infantil, em homenagem ao nascimento do genial escritor dinamarquês, Hans Christian Andersen, o pai da literatura infantil. Quem não se deliciou com as histórias de O Patinho Feio, A Pequena Sereia, O Soldadinho de Chumbo, A Pequena Vendedora de Fósforos e tantas outras? Andersen escrevia para crianças com palavras e sentimentos a ela adequados, sem suavizar a realidade ou pasteurizar as emoções. Falava de amores impossíveis, da miséria, de incapacidade física, da vaidade e de tudo que é humano, bom ou ruim, de uma forma que todos entendiam, adultos e crianças. Não à toa, é o maior herói da Dinamarca, um dos países mais desenvolvidos do mundo e a maior atração de Copenhagem é a estátua da pequena sereia, no porto.

No dia nove, comemoramos o Dia Nacional da Biblioteca, cujo papel social, além da disseminação da informação, é o da inserção das comunidades ao conhecimento e em suas práticas. Num país como o nosso, em que o livro não circula nas famílias mais pobres, e em que a maioria das cidades não possui livraria, a biblioteca, seja escolar, seja comunitária, tem papel importante na formação do leitor e do cidadão. Lembro-me da importância que teve na minha formação a Biblioteca Dr. Custódio Tristão, em Guaçuí. Passei lá muitas horas da adolescência, lendo o precioso acervo distribuído pelo SNL (Serviço Nacional do Livro), extinto pelo famigerado Collor, que o Diabo o carregue.

Dezoito de abril é o dia do nascimento de Monteiro Lobato, o criador da literatura infantil brasileira. Lobato recriou o imaginário da criança brasileira com o seu Sítio do Pica-pau Amarelo e seus personagens antológicos: Pedrinho e Narizinho, Emília e suas aprontações, dentre tantos outros. Trouxe o Saci para o centro da narrativa folclórica e uma lembrança da Cuca que nenhuma criança esqueceu. Lobato nos ensinou a brasilidade, com todas as suas nuances, até a do racismo, para pensarmos nossa (de)formação cultural. E, por último, o dia 23, dia mundial do livro e dos direitos autorais, em comemoração ao nascimento de Skakespeare, Cervantes e Garcilaso de la Vega. Parabéns aos escritores, aos bibliotecários e, sobretudo, aos leitores, sem os quais não faz sentido escrever.

Por Francisco Aurélio Ribeiro, membro da Academia Espíritosantense de Letras, que presidiu por vários mandatos.