Julho, 2020 - Edição 257

Centenário do saudoso Castelinho

Com vocação literária comprovada ao longo de seus textos, estendida pelo talento jornalístico, o acadêmico Carlos Castelo Branco teria completado 100 anos no dia 25 de junho.
A história de Carlos Castelo Branco confunde-se com a história da redemocratização brasileira. Piauiense nascido em 1920, em Teresina, o filho do desembargador Cristino Castelo Branco estudou em Belo Horizonte, onde se formou em Direito, pela Universidade de Minas Gerais, em 1943. Jornalista desde 1939, trabalhou nos Diários Associados, passando por diversos cargos de chefia. Fixou-se como repórter político, a partir de 1949, inicialmente em O Jornal, depois no Diário Carioca e na revista O Cruzeiro.

Com a criatividade e acuidade de suas narrativas, Castelinho, como era chamado pelos amigos, fez parte da “geração mineira de 1945”, ao lado de expoentes da escrita, tais como Otto Lara Resende, Paulo Mendes Campos e Fernando Sabino. Publicou, em 1952, o livro Continhos Brasileiros.

Único contista piauiense citado por Herman Lima no livro Variações sobre o Conto (MEC), a trajetória exclusivamente literária foi até a publicação do belo romance Arco de Triunfo, em 1959. A partir daí, deu lugar a uma das mais brilhantes carreiras do jornalismo brasileiro. Além da aptidão jornalística de testemunhar, registrar e reter na memória, era também uma estrela de primeira grandeza na arte de interpretar os fatos políticos. Certamente, estaria no centro de todos os debates sobre os assuntos que hoje nos envolvem.

Otto Lara Resende assim o descreveu, em uma das muitas homenagens ao amigo: “De pequena estatura, cara oblonga de piauiense recheado de silêncio, o Carlos Castelo Branco dos tempos iniciais de Belo Horizonte, quando lá chegou, pouco tem a ver, aparentemente, com o homem desenvolto e o ágil colunista político de então.” E concluiu: “O tempo tornou-o mais jovem: desatou-lhe a língua.” A Coluna do Castelo, no Jornal do Brasil (JB), representou, por unânime consenso, a peça mais importante do jornalismo político brasileiro.

Sua leitura, todos os dias, constituía uma obrigação fundamental de todas as pessoas com qualquer dose de interesse, direto ou indireto, na vida pública do país. Chefe da sucursal do JB em Brasília, cargo que exerceu de 1962 a 1972, foi colunista político até o fim da vida.

Um dos marcos inaugurais do jornalismo de análise, Castelinho dissecava o fato político com precisão e frieza de cirurgião. Todos osângulos eram examinados sem a paixão do panfletário e o comprometimento do ativista. A informação era trabalhada, analisada em correlação com outros fatos presentes, dos quais sempre retirava projeções de consequências futuras. Uma verdadeira aula de jornalismo diário.

Publicou uma série de livros, reunindo suas colunas, sobre os fatos que precederam e sucederam o “Movimento de março de 1964”: os dois volumes de Introdução à Revolução de 1964 e os quatro volumes de Os Militares no Poder, que teriam seu seguimento, conforme disse, “na medida da persistência do interesse público por um depoimento que, à margem da história, procura dar apenas uma visão parcial e contemporânea de situações complexas, repetitivas, monótonas, mas apaixonantes”.

Desde a queda da ditadura Vargas, Castelinho passou a viver e a respirar com as instituições políticas. Em épocas de mais liberdade, tornava-se uma das personalidades mais importantes da redação. Nas épocas de repressão, estava sempre na lista dos encarcerados. Apesar de conservador e pacato, seus escritos apontavam as falhas, analisando os fatos sem poupar os poderosos.

Maior colunista político da imprensa nacional na segunda metade do século XX e referência para inúmeras gerações de profissionais da imprensa em todo o país, foi eleito, em 1976, presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal, cargo que exerceu até 1981. Em 24 de outubro de 1978, foi homenageado com o prêmio Maria Moors Cabot, pela Universidade de Columbia, em Nova York, destinado aos jornalistas notáveis das Américas. Recebeu também o Prêmio Mergenthaler, de liberdade de imprensa; o Prêmio Nereu Ramos de Jornalismo, dado pela Universidade de Santa Catarina; e o Prêmio Almirante, na área de jornalismo.

Membro da Academia Piauiense de Letras e do Pen Clube do Brasil, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 4 de novembro de 1982, na sucessão de R. Magalhães Júnior, recebido pelo acadêmico José Sarney. O saudoso Castelinho morreu, aos 72 anos, no Rio de Janeiro, no dia 1º de junho de 1993.

Na definição da jornalista Dora Kramer: “Era um mestre no bordado dos detalhes e ensinou ao Brasil a desvendar entrelinhas, a fim de compreender o jogo do poder numa época em que tudo o que o poder queria era esconder o jogo.” Está imortalizado entre um dos jornalistas que mais prestaram serviços ao país, não só pela acuidade dos textos, como pela coerência e pelas convicções. O jornalista Castelinho era admirado pela capacidade de cruzar informações sem perder a essência do principal.

Por Manoela Ferrari